34 Diabetes
34.1 Introdução
O diabetes mellitus constitui em uma deficiência no aproveitamento de glicose pelo indivíduo. Como a glicose é a principal fonte de energia para a manutenção de todas as células do corpo humano, o diabetes causa uma infinidade de transtornos metabólicos, já que, não havendo glicose, o organismo tem de utilizar outras fontes de energia, tais como gorduras, aminoácidos e outros tipos de açúcares, produzindo substâncias em teores não usuais, e aumentando a quantidade de glicose no sangue e tecidos. Os sinais característicos do diabetes são mnemonicamente lembrados pela sigla PPP, que quer dizer, poliúria (muita urina), polifagia (muita fome) e polidispsia (muita sede).
Isso ocorre porque o organismo não consegue guardar a glicose, excretando-a na urina. Como a glicose é um carboidrato, e todo carboidrato se liga na água, o indivíduo faz muito xixi e, perdendo água, tem muita sede. O não aproveitamento da glicose faz também com que o indivíduo tenha muita fome, a fim de repor a energia sob uma forma diferente daquela suprida pela glicose. Como existem diversas causas do diabetes mellitus, os cientistas tiveram de classificá-lo para uma melhor compreensão. Assim, existe o diabetes mellitus tipo I, onde o indivíduo não produz o hormônio necessário para colocar a glicose pra dentro da célula, a insulina, e o diabetes mellitus tipo II, onde o problema não é a produção de insulina, mas qualquer outra coisa que impeça sua captação ou efeito.
Apesar do diabetes mellitus estar associado com a imagem de alguém injetando insulina no próprio corpo, apenas 10% da população acometida pela doença o fazem, já que seu organismo nasce sem a capacidade de sintetizar a insulina. A grande maioria dos pacientes com diabetes mellitus têm a insulina, só que não conseguem aproveitá-la. Isto ocorre porque pode haver uma deficiência na sua absorção pelas células, uma deficiência em seu receptor celular, um problema nas proteínas transportadoras de glicose para dentro da célula (GLUT-4), ou doenças associadas ao pâncreas (orgão produtor da insulina), como infecções severas, pancreatite, traumas, alcoolismo ou uso de fármacos. Seja como for, em ambos os casos do diabetes mellitus, tipo I ou tipo II, a glicose não entra pra dentro da célula, não podendo ser metabolizada para gerar energia (ATP). Nesse caso, ocorrem complicações variadas.
O acúmulo de glicose (e também de frutose e galactose) dentro da célula faz com que água seja puxada pra o seu interior, levando a um edema do tecido, causa principal da catarata, de neuropatias, de nefropatias (rins) e de problemas vasculares, como derrames e gangrenas. Além disso, como a glicose não é utilizada, o organismo passa a fazer uso de gorduras para produzir energia. Acontece que a degradação de gorduras aumenta muito a produção de uns ácidos orgânicos chamados de corpos cetônicos. Como são ácidos, abaixam o pH dos tecidos até um ponto onde as proteínas e enzimas não conseguem mais trabalhar, o que pode resultar no óbito do paciente diabético.
34.2 Detalhes
O termo “diabete” é definido como uma condição clínica indicada pela eliminação anormal de urina (poliúria), mas é usualmente utilizado para designar a hiperglicemia, ou aumento da concentração de glicose no sangue (diabetes mellitus). O diabete, dependendo de sua origem, pode ser classificado como insípido, renal, gestacional ou melito. O diabete insípido se dá por uma deficiência no ADH, hormônio anti-diurético. Neste caso, ocorre uma diminuição na reabsorção de água nos túbulos coletores renais, alterando a concentração da urina (baixa densidade). O diabete insípido constitui uma síndrome caracterizada pela emissão de um grande volume de urina (poliúria).
Não obstante, os níveis glicêmicos permanecem normais (urina e sangue). O diabete renal, por sua vez, caracteriza-se por um defeito nos túbulos renais na reabsorção da glicose (hereditário ou adquirido), com consequente glicosúria. O diabete gestacional ocorre quando há baixa tolerência à glicose durante a gravidez. Atinge de 1 a 3% de mulheres grávidas, das quais 30% poderão vir a estabelecer o diabete melito nos anos subsequentes ao parto. O diabete melito constitui uma síndrome originada na ausência ou ineficiência de insulina, e caracterizada pelo aumento do teor glicêmico sanguíneo (valor de referência: 90mg/dl), acompanhado de sinais clínicos característicos (poliúria, polidispsia, polifagia - o trinômio PPP, e perda de peso). Como progresso da doença, os pacientes podem vir a desenvolver cetoacidose, catarata e complicações microvasculares (neuropatia, nefropatia, aterosclerose e doença coronariana).
O DM possui prevalência estimada em 2,5% da população mundial (mais de 150 milhões de pessoas em todo o mundo), com 1-2% na população do mundo ocidental, 15 milhões de norte-americanos (5% da população), e 10 milhões de brasileiros (7% da população). Os diabéticos apresentam uma morbidade elevada (3a. causa de morte nos EUA), pontuada por perda da visão, insuficiência renal em estágio terminal, amputação de membros inferiores, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebras, AVC.
O diabete melito constitui uma síndrome de múltiplas etiologias, patogêneses e formas de herança. Neste sentido, é classificado atualmente em 4 grupos: DM tipo I (antigo DMID, diabete melito insulino-dependente, causado por uma destruição primária das células
Essa classificação é admitida pelo ADA, American Diabetes Association, desde 1997. Estágios intermediários de condições clínicas evidenciam tolerância à glicose alterada e glicemia de jejum alterada. Os tipos mais comuns do DM constituem o tipo I e II. O DM tipo I é a forma predominante em indivíduos abaixo dos 20 anos de idade, representando menos de 10% dos casos de diabetes. Há destruição ou degeneração das células-
No DM tipo I é comum a presença de anticorpos anti-células de ilhotas (anti-ICA, 85% dos pacientes) e anti-carboxilase do ácido glutâmico, anti-GAD. Os pacientes apresentam o trinômio PPP de poliúria, polifagia e polidispsia, abruptamente. O DM tipo I leva a uma alteração metabólica com exarcebação do catabolismo, na qual a insulina circulante é virtualmente ausente (insulinopenia), o glicagon plasmático está elevado, e as células-
O DM tipo II pode também ter correlação com o histórico familiar do paciente (genes diabetogênicos, podendo produzir maturações imperfeitas de pré-pró e de pró-insulina). Os pacientes com DM tipo II costumam apresentar forte obestidade, que leva à deformação de receptores insulínicos. Os fatores de risco do DM tipo II incluem antecedente familiar, obesidade, diabetes gestacional, hipertensão arterial, hipertrigliceridemia, e idade.
As complicações crônicas do DM são de ordem microvascular e macrovascular. As complicações microvasculares incluem retinopatia diabética (microaneurismas em torno do nervo óptico), catarata, neuropatia e nefropatia diabética (microalbuminúria como marcador). A catarata e a neuropatia diabética têm origem no desvio do metabolismo da glicose, frutose e galactose. Estes compostos, em excesso em tecidos insulino-independentes (nervos periféricos, cristalino, fígado, cérebro, rins e hemácias), são convertidos para sorbitol, um poliol mais polar que a glicose, pela aldose redutase. O sorbitol retém água, levando a uma hiperosmose intracelular, com influxo de água, edema e lesão celular.
No cristalino a hiperosmose secundária ao acúmulo de glicose gera edema, opacidade, e finalmente catara. Nas hemácias, o acúmulo de sorbitol desloca o 2,3-DPG, reduzindo a habilidades das mesmas em carregar o oxigênio. A degradação do sorbitol se dá através da sorbitol desidrogenase, que o converte, por exemplo, em frutose. Esta enzima é deficiente em tecidos insulino-independentes. A ligação de glicose em proteínas sanguíneas também colabora para as disfunções microvasculares. A dosagem de proteínas glicadas é utilizada no monitoramento do controle da glicose a longo prazo em indivíduos portadores de DM, embora o exame de rotina não possua valor diagnóstico para o DM.
Em pacientes diabéticos, ocorre um aumento da fração de hemoglobina Hb A1c (existem 3 tipos Hb A, 1a, 1b, e 1c), devido à ligação irreversível de glicose a um resíduo de valina da cadeia
O aumento da formação de corpos cetônicos pode levar a cetonemia, passando secundariamente para cetonúria, cetose, acidose metabólica, coma e morte. O coma ocorre devido a alterações eletrolíticas, desidratação celular, redução da circulação cerebral (hipóxia), e por distúrbios dos processos metabólicos devido à acidose. O metabolismo de lipoproteínas plasmáticas também está alterado no DM. No DM tipo I ocorre hipertrigliceridemia, em consequência da diminuição da atividade da lipase lipoprotéica, aumento do fluxo de ácidos graxos, e aumento da síntese hepática de triglicérides. O tratamento do diabetes mellitus depende de sua classificação. No DM tipo II, a terapia é dada através do controle dietético e redução de peso, afim de se corrigir a hiperglicemia. Agentes hipoglicemiantes como as sulfoniluréias ou a insulinoterapia podem ser requeridas. No DM tipo 2 a insulinoterapia é a base do tratamento.
Pode ser administrada na forma padrão (o bem-estar clínico do paciente torna-se o objetivo central), com resultados em torno de 250mg/dl de glicemia e 8% de Hb glicada, ou na forma intensiva (visa normalizar a glicemia com administração mais frequente de insulina), através de bomba de insulina de infusão contínua, com resultados em torno de 110mg/dl de glicemia e 6% de Hb glicada. O tratamento intensivo pode resultar em um aumento de três vezes na frequência de hipoglicemia. Muitos clínicos, entretanto, acreditam que o risco aumentado de hipoglicemia que acompanha a terapia intensiva se ajusta pela redução substancial na incidência de complicações a longo prazo, como a retinopatia e nefropatia diabéticas.
Síntese
- Diabetes melito; síndrome caracterizada por ausência (DMID, auto-imunidade de células
do das ilhotas do pâncreas, com sintomas de poliúria, polifagia, polidipsia, hipertrigliceridemia, hiperglicemia e cetoacidose), ou ineficiência de insulina (DMII, células disfuncionais, resistência à insulina); - Efeitos crônicos do diabetes (aumento de glicose): catarata (aumento do sorbitol metabolizado da glicose), e disfunção microvascular (ligação de glicose com proteínas plasmáticas); consequências tardias: cegueira, amputação de membros, derrame, infarto, insuficiência renal;